A pele é o maior órgão dos mamíferos e a primeira barreira de proteção do organismo. Muitas pessoas nem imaginam a relação direta entre problemas comuns de pele e a saúde intestinal.
A baixa diversidade bacteriana na microbiota intestinal pode estar intimamente relacionada com a dermatite atópica em cachorros. Isto é o que afirma a médica-veterinária Mariana Raposo, da Avert Saúde Animal.
“No sistema gastrointestinal, assim como em toda a pele, existe uma gama de microrganismos que variam entre fungos, vírus, protozoários e bactérias, vivendo de forma harmônica e com papéis importantíssimos na proteção e, no caso do intestino, fermentação das partículas de alimentos.”
A veterinária acrescenta que “este ecossistema invisível a olho nu é chamado de microbioma e é fundamental para a saúde como um todo”. A semelhança entre os dois órgãos vai além.
Tanto a pele quanto o intestino são altamente vascularizados e são responsáveis por separar e proteger o corpo (organismo) de possíveis agentes agressores provenientes do ambiente, seja por meio da barreira física (celular) ou biológica (microbioma).
O que causa o problema
Há muito tempo o desequilíbrio no microbioma (disbiose) intestinal já é correlacionado com quadros dermatológicos, principalmente porque a disbiose intestinal aumenta a permeabilidade celular e, como consequência, promove um aumento da absorção de toxinas e ativação de substâncias pró-inflamatórias.
Algumas situações como o estresse, consumo de medicamentos (especialmente antibióticos), uma má nutrição, alterações na dieta, presença de parasitas intestinais ou até mesmo reações vacinais podem desencadear problemas muito além de desarranjos intestinais.
“Qualquer situação que possa promover desequilíbrio do microbioma, que é quando a população de microrganismos patogênicos fica maior do que a de microrganismos benéficos, tem capacidade de interferir no organismo como um todo”, diz Mariana.
A veterinária aponta que um intestino não saudável pode promover reações de inflamação a pele, ocasionando, por exemplo, problemas dermatológicos como dermatite atópica, dermatite seborreica, pústulas ou mesmo interferir negativamente na cicatrização de feridas.
Essa relação íntima da pele com o intestino é reconhecida na medicina como Eixo Intestino-Pele, da mesma forma que existe o Eixo Cérebro-Intestino-Microbiota, e tem sido alvo de diversos estudos nos últimos anos.
A ciência já demonstra que uma má saúde intestinal, com uma microbiota desequilibrada, que além de estimular a produção de substâncias pró-inflamatórias pode atuar suprimindo o sistema imunológico, deixando o organismo mais suscetível a infecções.
“O organismo é inteiro interligado, todo conectado, e isso está cada vez mais evidente. Cada indivíduo possui um microbioma intestinal único e altamente dinâmico, mas a composição básica dos microrganismos presentes neste microbioma tende a ser semelhante em animais saudáveis, o que sugere a existência de um balanço harmônico entre todos os vírus, bactérias, fungos e protozoários para a saúde como um todo”, reforça Mariana.
Como o tutor pode identificar o problema
Mariana explica que a coceira é o principal sintoma das dermatites nos cães – nem sempre o pet está se coçando por estar com pulga -, mas o ideal é que o tutor olhe atentamente a pele do animal ao menos uma vez por semana.
“A existência de vermelhidão, descamação, perda regional de pelos e feridas que demoram a cicatrizar, mesmo que o pet não apresente quadros de coceira, é indicativo de problema dermatológico e deve ser encaminhado ao médico-veterinário”, reforça a veterinária.
A dermatite seborreica, por exemplo, é uma inflamação da pele que ocorre quando a renovação e queratinização celular da pele está alterada e a produção das glândulas sebáceas está aumentada.
“Uma das consequências é a descamação que popularmente conhecemos como 'caspa', que é a descamação da pele (dermatite seborreica ‘seca’), mas a dermatite seborreica também pode ser ‘oleosa’, na qual predomina o aumento da produção de sebo”, destaca.
Nutrição e suplementação para problemas dermatológicos nos pets
Não é novidade que uma nutrição adequada traz diversos benefícios para a saúde de pets de todas as idades, mas o foco não deve ser apenas em evitar o ganho excessivo de peso ou diminuir as chances de problemas metabólicos como diabetes, colesterol e triglicérides elevados, gastrite e úlceras.
“Bem nutrir e estimular as atividades das bactérias boas que fazem parte do sistema digestivo é de extrema importância, em todas as idades dos pets, mas traz melhores resultados quando iniciada ainda na fase de filhote, fortalecendo a imunidade do animal e proporcionando um desenvolvimento mais saudável”, afirma Mariana.
A veterinária conta que este cuidado com a saúde intestinal pode ser feito com uma dieta balanceada e a utilização de simbióticos capazes de potencializar o equilíbrio e bom funcionamento do microbioma intestinal.
Simbióticos são suplementos que combinam prebióticos, compostos responsáveis por nutrir e estimular de maneira saudável os microrganismos benéficos presentes no sistema digestivo. Já os probióticos são compostos por pequenos grupos de fungos e bactérias do bem capazes de melhorar o balanço do microbioma intestinal dos pets.
Um simbiótico bem equilibrado, por exemplo, vai apresentar agentes biológicos como Saccharomyces cerevisiae, Bifidobacterium bifidum, Enterococcus faecium e Lactobacillus acidophilus, que fazem parte de um microbioma saudável e funcional, além de vitaminas e minerais.
Alimentos podem ajudar a reverter os efeitos?
“Existem rações e suplementos alimentares à base de ômega 3 e 6 (extraído do óleo de borragem) que auxiliam no tratamento de pacientes com dermatites. Não é possível a cura com essas ferramentas, elas fazem parte de um tratamento multimodal para controle principalmente da dermatite atópica canina”, Mariana esclarece.
A saúde do pet deve ser observada pelo tutor com um “olhar 360°”, diz a veterinária, considerando o organismo como um todo, em que todos os detalhes importam.
“Se o pet apresenta um problema de pele, esse olhar precisa ser ainda mais criterioso, especialmente para a saúde gastrointestinal. É muito mais benéfico para o pet prevenir um desequilíbrio do microbioma intestinal do que tratar das suas consequências, por isso a adoção de simbióticos na rotina alimentar desde filhote deve passar a ser considerado tanto pelo tutor quanto pelo médico-veterinário. Cuidar da saúde gastrointestinal do peludo traz benefícios além dos óbvios, para toda a vida!”, afirma.
Adaptações externas que podem ajudar na saúde intestinal
Além de cuidar da saúde do pet por meio da nutrição, o tutor também pode realizar algumas adaptações no ambiente no qual o pet vive. Afinal, a saúde emocional também é um fator importante, e que pode desencadear problemas ao organismo.
“É sempre indicado que o tutor invista em enriquecimento ambiental para evitar quadros de estresse nos animais. Um ambiente confortável e limpo é essencial para um pet saudável e feliz”, aponta Mariana.
O tutor deve evitar banhos muito quentes, escovar frequentemente o pelo do pet (o que é uma boa maneira de identificar possíveis problemas) e não deixar a pele do pet úmida - medidas estas que também ajudam no cuidado com a pele.
Uso de cremes ou pomadas pode ajudar?
“A indicação de produtos de caráter medicamentoso, com o intuito de curar ou melhorar uma pele já inflamada ou lesionada, deve ser feita apenas pelo médico-veterinário no momento da consulta - só assim é possível entender quais as particularidades do caso e o que está originando o problema”, alerta a veterinária.
Ela reforça que, como método preventivo, para fortalecer a microbiota (cutânea e intestinal) do pet pode ser adicionada à rotina alimentar a suplementação com simbióticos.
“Mais específicos para a pele, a utilização de shampoos e cremes hidratantes elaborados especificamente para os pets. O ideal é que ambos sejam indicados pelo médico-veterinário que já conhece o animal”, finaliza.
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