Para os tutores, o uso de reforço positivo, como recompensa, tende a ser um método mais aceito
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Para os tutores, o uso de reforço positivo, como recompensa, tende a ser um método mais aceito

No treinamento de animais de estimação, principalmente no caso dos cachorros, são utilizadas quatro metodologias que, basicamente, consistem em recompensar o animal por um comportamento que se deseja que o pet execute - como dar um biscoito após receber um retorno positivo ao pedir que o filhote “dê a pata”.

Por outro lado, a “punição” é aplicada quando o cachorro tem um comportamento que o tutor deseja corrigir – como pular nas pessoas ou puxar a guia durante um passeio. Apesar do nome sugestivo, é importante ressaltar que o método não significa maus-tratos aos animais.

Reforço e punição são divididos em duas categorias cada, são elas: reforço positivo; reforço negativo; punição positiva e punição negativa. Para esclarecer cada uma delas e a forma como devem ou não ser utilizadas, o Canal do Pet conversou com os adestradores comportamentais  André L. AlmeidaGustavo Lima Porto e Anthony Hidalgo , que explicam o funcionamento de cada método e a forma como são utilizados para o treinamento de um cão.

O que é reforço positivo e negativo?

A recompensa de um cachorro não precisa ser necessariamente um petisco
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A recompensa de um cachorro não precisa ser necessariamente um petisco

“Quando se fala em ‘reforço’, as pessoas pensam em algo bom, e ‘punição’ é associado a algo ruim, contudo, isso está errado”, avisa André. “Os ‘mais’ e ‘menos’ significam ‘adicionar’ ou ‘retirar’.”

Para o adestrador, o mais importante é saber se o “indivíduo em situação de treinamento entendeu o que o treinador fez como reforço ou punição”. O especialista explica ainda que apenas o cão é quem “define” o que é reforço ou punição. “Eu posso achar que estou punindo, mas para o animal está sendo um reforço, e vice-versa”, aponta.

“O reforço, ou estímulo reforçador, para o behaviorismo, é a consequência dada a um comportamento - como dar um petisco após uma ação do filhote -, o que torna mais provável a repetição desse comportamento”, diz André, que explica na sequência a diferença entre reforço positivo ou negativo.

O reforço positivo consiste em acrescentar algo que tenha valor para o cachorro (como um brinquedo ou um petisco), após um determinado comportamento, assim o pet tende a repetir aquele ato para ganhar o que lhe interessa.

Já o reforço negativo é a retirada de um estímulo, aversivo ou desconfortável para o animal, após alcançar determinado comportamento que precisa ser previamente treinado.

“É importante ressaltar que se eu aplico algum estímulo que possa ser aversivo ou desconfortável para um indivíduo que não tem o comportamento treinado, isso é uma punição positiva”, explica o adestrador.

Ele acrescenta: “O único momento em que o ‘reforço negativo’ trabalha é quando você interrompe um estímulo, e isso confunde até mesmo alguns treinadores, que dizem que estão ‘aplicando um reforço negativo’. Mais uma vez, não é aplicar e sim a retirada: aplicou, puniu.”

Gustavo, que tem como foco a metodologia de reforço positivo, acredita que essa seja a forma mais simples de fazer com que o cachorro entenda o comando, além de ser mais fácil de integrar o treinamento para todos os membros da família.

“Além de criar o interesse do cão por uma recompensa, [o reforço positivo] é o jeito mais fácil para o adestrador transmitir o treino para o proprietário”, diz o especialista. “Hoje, se você não consegue colocar o treino do animal como parte da rotina da casa, você acaba não tendo resultado.”

Para ele, os tutores tendem a aceitar com mais facilidade o que se é passado ao animal de estimação quando se trabalha com o uso de recompensas.

“Sempre indico a utilização do reforço positivo.É muito mais simples para você implementar essa metodologia na vida dos tutores, fazendo assim com que o adestramento tenha uma taxa maior de sucesso, sem contar no interesse do pet, que adora uma recompensa – assim como nós humanos”, diz.

Já Anthony afirma que, ao aplicar seu treinamento, se baseia no que acredita que vai atender a necessidade do cão e dos tutores. Segundo ele, o uso de métodos alternativos e ferramentas podem facilitar e manter a segurança do animal e das pessoas durante o processo.

“Penso que seguir uma ideologia positivista ou não, faz com que exista uma certa limitação no desenvolvimento do treinamento”, diz o especialista. Ele aponta que educar um filhote é diferente de educar um cão agressivo, por exemplo. “Para um filhote é até possível educar apenas com reforço positivo, mas precisamos avaliar a condição dos tutores em seguir esse método.”

“Cada tem sua necessidade, e eu particularmente gosto de analisar caso a caso para decidir qual caminho é o melhor para aquele cão e para seus tutores”, acrescenta Anthony.

“Não sem antes orientar os tutores sobre como um cão pensa, se comunica e se comporta e as necessidades básicas dele para uma boa convivência, pois antes de tratar um problema precisamos entender a sua causa, e a causa sempre está na convivência entre tutor e cão.”

O que é punição positiva e negativa?

Existem enforcadores de variados modelos e materiais
André L. Almeida
Existem enforcadores de variados modelos e materiais

A punição, explica André, é um processo no qual se reduz a probabilidade de uma determinada resposta voltar a ocorrer por meio da apresentação de um estímulo aversivo, ou a retirada de um estímulo positivo, após um determinado comportamento considerado indesejado em uma terapia comportamental.

O estímulo positivo pode ser um brinquedo ou petisco, algo que o pet goste. Já o estímulo aversivo se trata de algo usado para causar desconforto, como uma guia, por exemplo.

Quando o tutor leva o pet para passear e o animal começa a puxar demais, “nesse momento o tutor para de andar e a pressão aumenta. O cão para de puxar porque essa pressão causa o desconforto e essa pressão por si só é a chamada punição positiva.”

André complementa: “O conforto que o cão recebe quando para de andar - e a pressão termina - é o chamado reforço negativo. Quando o cachorro começa a puxar durante o passeio e o tutor cede, dando a ele ainda mais espaço, ele está oferecendo um reforço negativo”. O especialista complementa que essa atitude, por parte do tutor, estimulará que o cão tenha o mesmo comportamento (de puxar) sempre que sair para um passeio.

Outros exemplos: “Se o cão pula no tutor, e ele coloca a mão nele e faz uma pressão para baixo, essa pressão é uma ‘punição positiva’. Quando ele [o cão] desce, a pressão acaba, aí a retirada da pressão é o ‘reforço negativo’.”, pontua André.

“Mas aí tem um detalhe, como é o cão quem define o que é reforço ou punição, se o tutor o colocar para baixo com a mão fazendo carinho, ele recompensará o pet, que continuará pulando cada vez mais, porque ele entendeu que assim receberá carinho. Isso é uma ‘punição positiva’ e não o ‘reforço negativo’”, detalha.

"Punição" e "Negativo" não são sinônimos de maus tratos

As palavras “punição” e “negativo” no treinamento canino, ao contrário do que pode parecer, não indicam em nenhum momento qualquer tipo de maus-tratos aos cães. Isso é bastante confundido entre tutores e até mesmo por alguns adestradores.

Punição positiva e punição negativa ajudam a diminuir a frequência de um comportamento considerado negativo. “Por ‘positivo’, se entende que algo será adicionado e ‘negativo’ é o ato de retirar. Não significa que um seja bom ou o outro ruim”, detalha André.

Um reforço ou uma punição só faz sentido quando aplicado no momento correto
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Um reforço ou uma punição só faz sentido quando aplicado no momento correto

Os reforços ou punições precisam ser aplicados apenas no momento exato, quando o cachorro corresponde a um comando positivamente, ou executa um comportamento considerado indesejado.

“Depois que um comportamento cessa, a punição não faz mais sentido”, diz André. “Por exemplo, quando o tutor vai passar por uma porta e o cão vai passar junto, se o tutor olhar para o cão e disser ‘Não!’, ele aplicou uma punição positiva. Ele acrescentou algo que fez com que o animal interrompesse um comportamento.”

A punição negativa é a retirada de algo de valor no momento daquele comportamento indesejado. “Como quando o cão toma alguma atitude para alcançar ou ganhar algo, e como não era o comportamento desejado o tutor retira o que o animal queria”, complementa André.

Como balancear os métodos de forma adequada

Para André, balancear o uso de reforçadores e punidores de comportamento é algo que exige experiência do treinador, “para não reforçar o momento errado e não entrar com a punição na hora errada, pois isso pode dificultar o aprendizado e até mesmo surtir o efeito oposto ao desejado naquele treinamento.”

Anthony ressalta: “Primeiro eu gosto de frisar para os tutores que existe uma diferença quanto às questões de reforço e punição, muitas vezes se acha que estamos punindo o cão, mas na verdade estamos reforçando.”

Ele acrescenta: “Quanto a quais métodos utilizar, cada caso é um caso. É preciso fazer uma análise do comportamento do cão e verificar a necessidade e eficácia de usar este ou aquele método, pensando sempre no bem-estar do cão, pois cada cão é único e não tem como pontuar enfaticamente que nos casos ‘X’ usa-se 'tal método'.”

Em casos de punições negativas e positivas, Anthony diz que é preciso avaliar cada cão para definir o que será usado: “Se estou trabalhando com um cão que tem agressividade e potencial para machucar alguém, a gente precisa utilizar algumas ferramentas como a guia unificada [também conhecida como enforcador] para ter uma maior segurança na contenção do cão.”

Para cães de porte grande, que têm mais força e resistência, Anthony recomenda o uso de guia unificada ou coleira de pescoço para se ter um melhor controle do animal caso seja necessário.

“Mas é sempre com uma avaliação prévia, pois este cão pode responder muito bem apenas com um peitoral, e isso serve também para os cães de pequeno porte.”

Gustavo diz ainda que: “Quando falamos de punições, temos que ter muito cuidado, pois cada cachorro tem uma sensibilidade diferente à bronca, e ambos os lados têm como objetivo a diminuição de um comportamento errado. Em uma punição positiva adicionamos um desconforto e na negativa retiramos a situação do comportamento errado, porém é bom sempre lembrarmos que a punição é a última instância, e até lá existem várias outras maneiras de ter um treino de sucesso.”

Para o especialista, em um treino de reforço positivo os resultados são mais visíveis e inclusivos a toda a família, pois “todos da casa podem e devem recompensar o comportamento correto.”

Já André pondera que o uso exclusivo de reforço positivo pode não surtir o efeito desejado a longo prazo, pois recompensa o animal por um comportamento positivo, mas não retira o comportamento indesejado.

“Reforço positivo não retira um comportamento indesejado, ele reforça comportamentos, então se em algum momento o cão, que não trabalhou com punições, começar com um comportamento inadequado, [os tutores] não saberão como impedi-lo e nada vai pará-lo, a menos que se ‘compre’ o cachorro com uma recompensa.”

O uso incorreto de acessórios

André reforça que punição positiva e negativa não devem ser encaradas como maus-tratos, e que caberá a pessoa que está aplicando o treinamento não exceder os limites.

“Se o treinador tem uma conduta punitiva e excede os limites, ou cria situações de punição desnecessária, pode sim ser considerado maus-tratos, baseado no contexto e intensidade nos quais foram usados. Existem relatos de casos em que o próprio dono, leigo, usou um equipamento de treinamento para torturar o cão. Além de ser punitivo para o animal, é uma clara situação de maus-tratos”, diz.



Anthony corrobora com a visão do colega de profissão: “Eu nunca indico o uso de qualquer acessório ou ferramenta sem antes ensinar para o tutor como utilizá-la, acredito que as ferramentas e acessórios podem sim auxiliar na educação do cão, mas nenhuma delas é milagrosa, se você não souber usar, pode ter problemas.”

Já, para Gustavo, o uso de ferramentas de punição e reforço negativo “são situações que devem ser evitadas, pois na maioria das vezes são explicadas e colocadas no treino de maneira errada, tornando mais difícil para o pet e para seus tutores.”

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