Um dos grandes destaques da cerimônia de posse do novo Presidente da República foi a participação da cachorrinha Resistência , o primeiro animal a subir a rampa do Palácio do Planalto. Mas essa não foi a única novidade do atual governo envolvendo animais de estimação, para a alegria dos amantes e protetores de animais em todo o país.
Uma em especial foi amplamente celebrada: o Decreto Nº 11.349 , de 1º de janeiro de 2023, assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) , que traz a inclusão do Departamento de Proteção, Defesa e Direitos Animais ao Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática .
Para os defensores da causa animal, a criação do novo departamento já é considerada uma vitória sem precedentes. O decreto que entrará em vigor no próximo dia 24 de janeiro , traz uma série de restruturações à pasta ambiental do governo.
“Espera-se que com esta secretaria o governo possa ter políticas públicas para coibir o tráfico de animais silvestres, principalmente oriundos da floresta amazônica; animais vítimas de maus-tratos, animais testados em instituições de ensino, indústria farmacêutica e de cosméticos, controle populacional de animais abandonados, exploração de animais de tração e para entretenimento, entre outros tipos de exploração”, diz a advogada animalista Antilia Reis , ao Canal do Pet.
O que o novo departamento pode ajudar na prática
Existem atualmente diversas leis em defesa dos animais, porém, ao considerar o número crescente de casos de abandono e maus-tratos de animais domésticos , além dos riscos à vida de animais silvestres, é um sinal claro de que as leis, na maioria das vezes, não são cumpridas da forma como deveriam.
A advogada da ONG Ampara Animal, Ana Carolina Arantes , aponta que a nova regulamentação e organização do Ministério pode trazer inúmeros benefícios aos animais por meio da promoção da proteção, defesa, bem-estar e direitos dos animais, não somente de cães e gatos, mas de outras espécies domésticas e domesticadas, assim como da proteção e defesa da fauna silvestre.
“Quando falamos em cumprimento da lei contra os maus-tratos, adentramos a Lei 9.605/98 , conhecida como Lei de Crimes Ambientais . Assim, devemos nos atentar que esta legislação abrange dentre os crimes contra a fauna, não somente os animais domésticos, mas também os silvestres e domesticados, sendo eles nativos ou exóticos”, diz Ana Carolina, ao Canal do Pet.
“No entanto, a Lei 14.064 , aprovada em 2020, incluiu especificamente o aumento de pena de dois a cinco anos ao crime de maus-tratos para cães e gatos, além da aplicação de multa e proibição da guarda, sem resguardar as demais espécies de animais”, ressalta a advogada, que acredita que, com o novo decreto, é possível ter esperança de que as leis sejam aplicadas na defesa da vida dos animais, independentemente de sua raça ou espécie.
Para Antilia Reis, a criação de um código em âmbito federal deve unificar as leis estaduais e municipais existentes e dar um rumo para os municípios e estados que não ainda têm legislação.
“Temos parado na Câmara, desde 2007, o Projeto de Lei 215/07 que cria o Código Federal de Bem-Estar Animal aguardando a criação de comissão especial para discutir o assunto”, diz a animalista. “Entendo que a criação deste Departamento irá desengavetar e acelerar os trâmites de PLs.”
O papel do Estado na proteção dos animais
Nos incisos III e VI é descrito que o departamento irá “coordenar a interlocução do Poder Público federal [...] com as organizações da sociedade civil que atuem nos temas de sua competência” e “identificar e apoiar a disseminação de boas práticas em temas de defesa da fauna doméstica, domesticada e selvagem e de garantia dos direitos animais”, além de outras relacionadas ao apoio às entidades da sociedade civil.
Desse modo, é possível entender um maior comprometimento do Estado para com a causa animal, sobretudo, dando maior incentivo aos órgãos da sociedade civil, como ONGs e protetores que, de acordo com Antilia, fazem o papel do Estado, sendo obrigados a atuarem com abrigos superlotados e, na maioria, "sem condições básicas e endividados para a manutenção dos animais".
“É dever do Estado proteger os animais, tanto domésticos quando silvestres, com fundamento na Constituição Federal, em seu artigo 225 ”, afirma.
Ana Carolina entende que, por meio da nova regulamentação e organização do Ministério, as ONGs e protetores independentes poderão ter maior apoio do Poder Público federal.
“O inciso IV do Decreto elenca, dentre as competências, a coordenação e definição de diretrizes para acompanhar o desenvolvimento de iniciativas relacionadas à proteção da fauna e das ações executadas por órgãos e entidades envolvidos na proteção e defesa e na promoção dos direitos animais”, explica.
“Com isso, acreditamos que a causa animal no Brasil estará mais amparada em suas ações e na busca pela defesa e proteção dos animais. Destacamos ainda a iniciativa da pauta regulamentada com a correlação com os direitos dos animais.”
“Percebe-se grande avanço que terá incidência na formação de novos entendimentos e conceitos perante a sociedade”, diz a representante da Ampara Animal, que mostra otimismo. “Só temos a comemorar mais esta conquista para os animais.”
O controle populacional no combate e o combate ao abandono
Segundo o inciso XVI , haverá maior apoio na implementação de políticas e programas para promover o controle populacional ético de cães e gatos. Um dos grandes problemas no Brasil, gerado pela reprodução indesejada de animais em situação de rua e vítimas do abandono.
Embora existam programas (muitas vezes oferecidos por ONGs) que ofereçam castração gratuitas para animais carentes, é fundamental que exista uma maior atuação por parte do governo.
“Espero que este Departamento possa uniformizar o método CED (Capturar-Esterilizar-Devolver) que é um método não letal de controle populacional de cães e gatos em situação de abandono, sendo a maioria ferais (que retornaram ao modo de vida selvagem, sendo de difícil socialização com humanos)”, aponta Antilia, que espera que o departamento consiga inserir políticas públicas para conseguir recursos para a implantação de Hospitais Veterinários Públicos .
“No meu entender, manter animais doentes abandonados na rua, geralmente nas regiões mais carentes e sem saneamento básico temos maior concentração, é caso de saúde pública, pois, animais doentes são vetores de doenças e zoonoses aos humanos”, diz. “Espero que este Departamento olhe para os animais como sujeitos de direitos, seres sencientes, protegidos pela Constituição Federal .”
Para Ana Carolina esta é uma questão complexa, ela explica que devemos nos atentar ao fato da importância de se estabelecer políticas e programas públicos para a conscientização da sociedade com relação ao bem-estar dos animais.
“Nesse contexto, a educação e a saúde devem andar de mãos dadas. A sociedade e, mais ainda, os guardiões dos animais, devem ter suas responsabilidades previamente estabelecidas com a guarda responsável e a necessidade básica de cada espécie animal. Precisam saber cuidar dos seus animais”, pontua a advogada, destacando que o que mais afeta o bem-estar dos animais está relacionado à falta de conscientização social.
“Desta maneira, o estado precisa e deve trabalhar priorizando leis e regulamentando a responsabilidade compartilhada entre o Poder Público e os tutores”, complementa.
Ana Carolina diz que o país precisa de medidas e informações que cheguem às pessoas de forma geral, sem nenhum tipo de distinção.
“As pessoas de baixa renda carecem de atendimento básico e opções para garantia do bem-estar dos animais como vacinas e castração gratuita. Nesse sentido é imprescindível que o Estado brasileiro realize investimentos em saúde preventiva com políticas públicas de controle populacional gratuitas e atendimentos de animais em Hospitais Públicos Veterinários voltados às pessoas com maior vulnerabilidade social econômica”, diz.
Há uma grande dificuldade, especialmente entre os mais carentes, de se pagar atendimentos em Hospitais Veterinários particulares, desde o pagamento de consultas, realização de exames e até mesmo a compra de medicamentos.
“Prioriza-se a saúde humana e esquece-se da necessidade de aplicação de uma saúde única, sem a qual mantemos nossos pronto-socorro e unidade básicas de atendimentos superlotados com doenças que poderiam ser evitadas se houvesse a conscientização e mudanças de hábitos”, ressalta a advogada.
Embora se entenda que apenas essas mudanças não resolvam o problema ou garantam que os animais tenham seu bem-estar garantidos, “já seria uma grande melhoria na busca pela dignidade e respeito animal."
“Possuímos cotidianamente a interação entre humanos e animais não humanos e a sociedade necessita de estruturas para atendimento de uma saúde única. O apoio na elaboração e implementação destas políticas, programas e projetos será fundamental para o avanço da causa animal por meio da oferta de castração gratuita e o acesso a população, consistindo numa medida justa e equitativa para uma sociedade consciente, sendo meios de prevenção de zoonoses, crias indesejadas e mais abandono”, completa.
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Veja o Art. 20, ou confira o decreto na íntegra clicando aqui .
Art. 20. Ao Departamento de Proteção, Defesa e Direitos Animais compete:
I - elaborar, propor, acompanhar, analisar e avaliar políticas, elaborar e implementar programas e projetos destinados à proteção, à defesa, ao bem-estar e aos direitos animais;
II - articular com órgãos e entidades do Poder Público federal, com a sociedade civil e promover a interlocução com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nos temas de sua competência;
III - coordenar a interlocução do Poder Público federal com as organizações internacionais e com as organizações da sociedade civil que atuem nos temas de sua competência;
IV - coordenar a definição de diretrizes e acompanhar o desenvolvimento, no âmbito do Poder Público federal, das iniciativas relacionadas à proteção da fauna e das ações executadas por órgãos e entidades envolvidos na proteção e defesa e na promoção dos direitos animais;
V - subsidiar tecnicamente a negociação e a implementação de compromissos e de acordos internacionais dos quais o País seja signatário em temas da proteção, da defesa e do bem-estar animal;
VI - identificar e apoiar a disseminação de boas práticas em temas de defesa da fauna doméstica, domesticada e selvagem e de garantia dos direitos animais;
VII - apoiar o planejamento, a organização e o acompanhamento da agenda ministerial, no âmbito de suas competências;
VIII - assistir tecnicamente aos órgãos colegiados na sua área de atuação;
IX - apoiar a mobilização das entidades da sociedade civil na discussão e na implementação de políticas de proteção, defesa e direitos animais;
X - apoiar e subsidiar a criação de medidas protetivas da fauna doméstica, domesticada, selvagem e silvestre em situações de desastres naturais e grandes calamidades, com vistas ao resgate e à adequada alocação dos animais em situação de perigo e vulnerabilidade;
XI - promover a cultura de proteção, defesa e direitos animais;
XII - promover a educação e a prevenção para proteção e defesa de animais domésticos e domesticados e para a preservação da fauna nativa;
XIII - estabelecer medidas preventivas de defesa, proteção, bem-estar e direitos animais;
XIV - estimular a capacitação de recursos humanos para as ações de proteção, defesa, bem-estar e direitos animais;
XV - apoiar ações necessárias à prevenção e ao controle de espécies exóticas invasoras que colocam em risco a conservação da biodiversidade nativa;
XVI - apoiar órgãos públicos competentes na elaboração e implementação de políticas, programas ou projetos para promover o controle populacional ético de cães e gatos; e
XVII - propor normas relativas a:
a) bem-estar, proteção, defesa e direitos animais; e
b) implementação nacional dos acordos internacionais relativos aos assuntos de bem-estar, proteção e direitos animais.