Companhias aéreas têm responsabilidade pela integridade de passageiros e carga durante todo o transporte
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Companhias aéreas têm responsabilidade pela integridade de passageiros e carga durante todo o transporte

O caso da morte do cachorro Golden Retriever chamado Joca, que viajava sob os cuidados da companhia aérea Gol, reacendeu o debate sobre os direitos dos animais de estimação no transporte aéreo, em que, na maioria das vezes, devem viajar no compartimento de carga das aeronaves.

No Brasil não existe uma lei padrão e cabe a cada companhia estabelecer as próprias regras para o transporte de pets em seus voos. Os tutores dos animais devem cumprir uma série de requisitos, como apresentar comprovantes de saúde e vacinação do pet, caixa de transporte adequada, entre outras. Porém, mesmo quando todas essas regras são seguidas, os problemas podem partir da própria companhia aérea, que pode causar danos ao animal, como perdê-lo durante o transporte ou, como no caso de Joca, levar o pet a óbito.

Nesses casos, é importante que os tutores conheçam seus direitos e saibam quais medidas legais devem tomar em busca de justiça e que as companhias aéreas sejam responsabilizadas por negligência.

O advogado e professor de Direito Antonio Minhoto aponta que, no caso de Joca, a responsabilidade da companhia aérea é “claríssima”.

“A companhia aérea é responsável pelo transporte da carga e dos passageiros, inclusive e especialmente por sua integridade. Essa responsabilidade é, do ponto de vista jurídico, objetiva, ou seja, não é preciso provar que a empresa tenha agido com culpa. Basta comprovar a existência do dano/prejuízo e que este foi causado pela companhia”, afirma Antonio ao Canal do Pet .

O advogado diz ainda que a companhia deverá “responder especialmente pelos danos morais causados, mas também poderá responder pelo crime de maus-tratos a animais, obviamente a depender da necessária apuração das responsabilidades”.

João Fantazzini, tutor de Joca,
Arquivo pessoal
João Fantazzini, tutor de Joca,

Para a advogada Giovana Duarte, tutores de animais vítimas de negligência por parte das companhias, como o que aconteceu com Joca, podem exigir indenização pelos danos morais e materiais causados, e as autoridades competentes poderão penalizar a empresa - inclusive dentro da lei de maus-tratos.

Quando houver algum problema com a companhia aérea, o responsável pelo animal deve entrar em contato com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para apurar o ocorrido.

Apesar da ausência de leis mais específicas, Giovanna afirma que é papel da Anac regulamentar e fiscalizar as atividades das companhias aéreas, “incluindo o transporte de animais, e pode aplicar penalidades em casos de descumprimento das normas”.

Levar o pet na cabine

Em outros países, como os Estados Unidos, é comum que os animais de estimação, sem restrição de espécie, possam viajar com seus tutores na cabine quando são classificados como “apoio emocional”. No Brasil, por outro lado, novamente fica a cargo das próprias empresas estabelecerem essas regras. Empresas como Azul, Gol e Latam, por exemplo, consideram apenas os cães como animais de apoio emocional.

Animais de outras espécies devem embarcar como um pet comum, dentro da caixa de transporte ou mesmo no compartimento de carga. Ainda assim, é possível recorrer na justiça,  como fez a estudante goiana Júlia Braz Fonseca Vargas, que foi autorizada pela justiça a embarcar com um furão de estimação , seguindo as normas da Anac.

“Há uma portaria da Anac (12.307, de 25 de agosto de 2023) que regulamenta o transporte de animais de estimação, de apoio emocional e de serviço (cão-guia, por exemplo). Só este último deve ser transportado sem custos e na cabine, junto ao passageiro. Os demais poderão ou não ir na cabine, a depender das regras de cada companhia aérea”, destaca Antonio Minhoto.

O advogado reforça que não há uma regra única e que cada companhia decide como organizar esse serviço. “De um modo geral, para que o pet possa viajar a bordo há restrições de raça e peso máximo (normalmente de 8kg a 10kg), além do uso de bolsa apropriada de transporte. Para animais de serviço, como o cão-guia, esse peso não é considerado.”

Seguro de viagem para animais

João encontrando Joca morto
Reprodução: Instagram
João encontrando Joca morto

Hoje é comum encontrar diversos serviços de plano de saúde para animais de estimação, no entanto, ainda não existem serviços de seguro de viagem dedicados aos pets. “Há seguros para transporte de animais como carga, mas de estimação, em específico, não há”, diz Antonio.

“O animal como carga, se extraviado, inutilizado ou morto, atrai uma indenização por seu valor de mercado. No caso do pet é diferente. Há um valor sentimental e portanto subjetivo, daí a dificuldade de um seguro específico. É possível segurar o pet, mas esse aspecto subjetivo do valor sentimental dificilmente será considerado na contratação”, pontua o advogado.

Os custos de transporte dos pets (passagens) também ficam sob a responsabilidade da companhia que oferece o serviço. “[Os valores] são definidos por cada companhia aérea e ela pode cobrar por esse transporte, seja na cabine, seja no porão da aeronave”, afirma Antonia, acrescentando que “só o animal de assistência não pode ter seu transporte cobrado e deve ir na cabine junto com seu assistido.”

Viagens internacionais

Em caso de viagens para internacionais, Antonio Minhoto explica que há uma conjugação de normas que devem ser seguidas, dentro ou fora do país. “Os tribunais brasileiros aceitam a aplicação do código de defesa do consumidor se o voo teve origem ou destino ao Brasil. Mas a Convenção de Montreal, que regula a responsabilidade das companhias aéreas, também estipula regras de proteção ao passageiro e à carga transportada, inclusive com pré-fixação de valores indenizatórios.”

O que fazer em caso de morte do animal

Giovana Duarte explica que a legislação brasileira trata os casos de maus-tratos de animais durante o transporte aéreo através da chamada Lei de Crimes Ambientais (nº 9.605/98).

“O artigo 32 desta lei prevê que é crime praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais. No caso do animal ir a óbito por imprudência da companhia aérea, sim, isso pode ser considerado crime de maus-tratos e a empresa responsável pode ser penalizada. A pena prevista para esse tipo de crime é de detenção de três meses a um ano, além de multa”, diz a advogada.

Quando o crime é cometido por uma empresa, Giovanna ressalta que a legislação brasileira prevê a responsabilização civil e administrativa da empresa aérea em casos de morte ou maus-tratos a animais durante o transporte.

“A empresa pode ser obrigada a indenizar os proprietários do animal e sofrer sanções administrativas, como multas e suspensão de atividades. Portanto, sim, a imprudência da companhia aérea que resulte na morte de um animal durante o transporte pode levar à prisão de alguém e a uma sentença de detenção, além de outras penalidades previstas em lei”, afirma, acrescentando que “a companhia aérea Gol [no caso Joca ] poderá ser penalizada pelas autoridades competentes por negligência, além de sofrer sanções administrativas e judiciais.”

Não foi a primeira vez

A morte de Joca, que ocorreu em um voo da Gol, não é uma novidade. Em 2021 um  filhote de Golden Retriever e um  American Bully morreram em condições semelhantes ao serem transportados por voos da Latam. Na ocasião, a companhia suspendeu o serviço por 30 dias, mesma providência tomada pela Gol, em decorrência da morte do cãozinho Joca.

Para Giovanna, as empresas devem adotar medidas para evitar novos casos de morte de animais em voos. “Medidas como aprimoramento dos procedimentos de transporte de animais, treinamento dos funcionários responsáveis pelo manuseio dos animais e fiscalização mais rigorosa podem ajudar a evitar casos como o do cachorro Joca no futuro.”

A advogada aconselha ainda que famílias que passem por situações como essa procurem por advogados especializados em direito animal, esses profissionais poderão orientar da melhor forma sobre os procedimentos legais a serem seguidos para buscar justiça.

“As companhias aéreas devem tomar cuidados como oferecer condições adequadas de transporte, garantir a segurança e o conforto dos animais, informar os passageiros sobre as regras e procedimentos, entre outros. A legislação brasileira protege os direitos dos animais durante o transporte aéreo através de normas específicas que regulamentam o transporte de animais de estimação, visando garantir o seu bem-estar e segurança durante o voo”, completa.

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