Teoria da Dominância: como lidar com a dominância em cães?

É comum se ouvir que os tutores precisam ter pulso firme e mostrar aos cães “quem manda” na casa, para que os pets não se tornem teimosos e se sintam como os “líderes da matilha”. Mas será que isso é realmente verdade?

Um pensamento ultrapassado

Camilli Chamone, geneticista e consultora em bem-estar e comportamento canino, assegura que esta é uma conduta ultrapassada. Ela lembra que a origem desse entendimento vem de 1970, com a Teoria da Dominância, criada pelo biólogo Lucyan David Mech e retratada na obra "The Wolf".

O que dizia a Teoria da Dominância

Ela se referia ao comportamento de lobos, por meio de observações do cientista. Mech afirmava que as famílias desses animais eram lideradas por lobos fortes e dominantes (alfa), enquanto, os submissos os obedeciam. Os alfas, portanto, exerciam controle e ditavam as decisões sobre os outros membros do grupo.

A transposição é incorreta

Chamone diz que a teoria foi trasposta para a relação humano-cão, até mesmo por profissionais em comportamento canino. Porém, em 2005 o próprio Mech veio à público desmentir, constatando que o avanço de pesquisas comprova que a Teoria da Dominância não tem embasamento científico.

O funcionamento do cérebro

Com o avanço da neurociência no século 21, foi possível avaliar comportamentos em determinadas circunstâncias. "Entendemos o erro de Mech em 1970, pois a neurociência ainda é muito jovem – e pesquisas referentes ao cérebro de animais, mais ainda. Um estudo que conta muito sobre o cérebro dos cães é de 2017, apenas cinco anos atrás!”, diz Chamone.

O seu pet não quer te dominar

Ao detalhar o funcionamento do cérebro, a neurociência mostra que os cães não têm habilidades de criar suposições sobre o que o outro está sentindo ou pensando e, a partir daí, bolar planos maquiavélicos. Isso é chamado de Teoria da Mente, e apenas primatas ditos superiores, incluindo os humanos, têm essa competência cognitiva.

A inteligência canina

Os cães têm o desenvolvimento cognitivo e emocional equivalente ao de uma criança de 2 anos; ou seja, eles não têm um cérebro desenvolvido, ao ponto de quererem nos dominar, o que invalida, de vez, a Teoria da Dominância.

Comportamentos à luz da neurociência

Mas, então, o que significam os comportamentos como se o cão quisesse “mandar na casa”? Chamone explica que "o andar na frente do dono só mostra que o pet tem hábitos exploratórios, algo totalmente natural. É comum e saudável querer farejar, cavar, e explorar o ambiente do passeio".

Comportamentos que requerem atenção

Comportamentos agressivos e de monta requerem mais atenção porque, provavelmente, eles estão em sofrimento. "A agressividade se torna uma necessidade quando o cão se sente ameaçado, e a única forma de se defender é mordendo. Se chegou a este ponto, o dono precisa buscar ajuda profissional, pois além de ter um pet em extremo estresse e sofrimento, a família pode estar em risco".

A monta fora do contexto sexual

A monta compulsiva, fora do contexto sexual (macho diante de fêmea no cio) é chamada de estereotipia comportamental – ou seja, uma forma que o cão encontra para aliviar a ansiedade que está sentindo. "O mesmo podemos dizer para outros padrões compulsivos, como lambeduras intermináveis, excesso de latidos e comer o seu próprio cocô", exemplifica.

O comportamento canino à luz da neurociência

Entender o comportamento canino nos traz conhecimento e sabedoria. Chamone diz que não faz sentido submetermos os cães a atitudes autoritárias para que nos obedeçam e nos respeitem, sem qualquer embasamento em ciência. “Cabe a nós usarmos o nosso 'supercérebro' evoluído para entendermos a espécie diferente e encantadora que trouxemos para a nossa casa, garantindo o bem-estar e a tranquilidade de todos da família.”