Mitos e verdades sobre a surdez canina

Em setembro são celebradas duas datas dedicadas à comunidade surda, dia 26 é o dia nacional e dia 30 é o dia internacional do surdo, datas que motivaram a criação do “Setembro Azul”, o Mês da Visibilidade da Comunidade Surda. A data se refere às pessoas, claro, mas os pets também merecem ser lembrados

A surdez nos pets

Muitos cães de raça pura (e gatos) sofrem de surdez por razões genéticas, outros podem sofrer posteriormente por questões de saúde. Muitos tutores passam por dificuldades por não saberem como lidar com essa condição do pet.

Pixabay

Como é conviver com um pet surdo

O que implica, na prática, conviver diariamente com um cão surdo e no que isso se difere de viver com um cão que escuta? A psicóloga Carolina Jardim é especialista em comportamento animal e, de forma resumida, nos ajuda a sanar algumas dúvidas sobre essa condição dos pets.

Redação EdiCase

As principais dúvidas

“Existem muitos mitos sobre o assunto, mas é possível elencar alguns pontos principais que podem ajudar tutores de cães nascidos surdos”, diz Carolina, que tem experiência com cães surdos há 13 anos. Confira 7 mitos e verdades sobre a surdez canina:

“Se ele não escutar, não vai entender o que eu falo”

Os cães têm mais facilidade para ler nossa postura corporal e gestual do que entender palavras. Você precisa se treinar para colocar toda a sua “fala” no seu corpo. Se quer que o cão faça algo, evite falar, não é justo usar uma língua que ele não entenda! Coloque toda a sua comunicação em gestos, postura corporal e até expressão facial. Não há limites para o número de sinais que um cão surdo pode aprender.

“Se não escuta, não consegue se comunicar com outros cães”

Esse é um mito muito recorrente. E aqui, mais uma vez, a linguagem corporal vai ser a principal via de comunicação. Cães são incríveis em demonstrar sinais de quando estão desconfortáveis, com medo ou felizes

Leitura corporal

Os cães conseguem ler a postura corporal dos outros cães com muita facilidade. Mesmo quando outro cão está rosnando para um cão surdo, apesar de não escutar o rosnado, ele consegue perceber que o lábio do outro cão está tenso, o olhar mais fixo e a postura corporal também.

“Meu cão surdo fica agressivo quando acorda”

Essa é uma das maiores queixas de tutores. É importante aprendermos a nos colocar no lugar do pet. Imagine você só descobrir que alguém está perto de você quando é tocado? Não é raro um cão surdo, ao ser acordado, se assustar e atacar seus tutores, ou outro cachorro da casa.

O jeito certo de acordar

Uma forma de prevenir é acordá-lo pelo olfato (com uma comida bem cheirosa) ou se acostumar a tocar sempre no mesmo lugar – eu sempre toco no ombro – de maneira suave, como um carinho. Dessa forma, mesmo que ele se assuste, vai se “lembrar” que é você e que está tudo bem.

“Meu cão surdo não pode passear solto.”

Antes de tudo, passear com um cão solto não é uma boa ideia. A segurança precisa sempre estar em primeiro lugar. Quando você o chama, não significa que seu cachorro virá, mesmo se um gato cruze seu caminho, uma moto ou mesmo outro cachorro. Se o cão for surdo, o desafio ainda é maior, pois precisam de contato visual ou do toque para virem quando chamados.

Use os estímulos corretos

Muitas pessoas usam colares eletrônicos, no estímulo de vibração (nunca no estímulo eletrônico!) para associar ao vem, quando o cão está longe. Essa é uma opção para tutores muito dedicados e cuidadosos, pois, por serem mais sensíveis, mesmo na vibração, o cão pode associar com algo negativo e vir até você por medo, e não por associar a algo bom. E isso é muito ruim para a relação do cão surdo com você. Nunca use ferramentas que irão ameaçar a confiança dele em você! Nesse caso, é melhor soltá-lo apenas em áreas cercadas ou utilizar guias longas.

"Surdos desenvolvem mais os outros sentidos"

Eu queria poder responder essa pergunta com toda a certeza, mas, infelizmente, não há pesquisas que comprovem isso. Pela minha experiência com cães surdos – e se fizermos um paralelo com pessoas surdas – é isso mesmo! Cães surdos parecem ter o olfato ainda mais desenvolvido do que cães ouvintes. A visão, sem dúvida, é o sentido que eles mais usam para se comunicar conosco.

Atentos aos movimentos

Eles são muito atentos a tudo o que acontece ao seu redor e se guiam pela movimentação de outros cães e das pessoas. O tato é um sentido que, geralmente, cães surdos costumam ter bastante sensibilidade. Por isso, é bem importante que você acostume seu cão surdo a ser tocado, manipulado e simule possíveis procedimentos que ele terá que passar, como limpeza de ouvido, corte de unhas, exames clínicos. Dessa forma, você irá prevenir problemas futuros de medo ou de agressividade.

“Cães surdos têm mais problemas comportamentais”

Eu adoraria dizer que não. Mas, na realidade, essa é uma questão complexa. Dos mais de 60 cães surdos que já atendemos em todo o mundo, 40% demonstram algum tipo de comportamento compulsivo, como correr atrás do rabo, lambedura excessiva ou, principalmente, perseguir sombras e luzes – que é o caso do meu Dálmata, o Milka.

Divulgação

Ansiedade e agressividade

Muita gente acha que eles são mais ansiosos ou até agressivos e, segundo alguns estudos, isso é um mito. Quando comparados a cães normais sensorialmente, cães com deficiência (surdos/cegos) não demonstram, de modo geral, maior agressividade ou maior ansiedade. Por outro lado, parecem ter uma tendência maior para compulsão e latidos excessivos. Quem pensa que por ser surdo, o cão não vai latir, está muito enganado!

“Ter um cão surdo não é pra qualquer pessoa”

Infelizmente, o número de cães surdos abandonados ou em abrigos é muito grande e eu adoraria poder dizer para qualquer pessoa que queira adotar um cão, para escolher um cão surdo. Mas, de verdade, cães surdos exigem mais da gente.

Adaptar o ambiente ao pet surdo

É preciso uma maior dedicação para conhecer sobre comportamento e sobre treinamento; ajustar sua forma de se comunicar; fazer um bom manejo do ambiente para garantir a segurança dele; cuidar para que a rotina satisfaça suas necessidades; alinhar toda a família para que todos “falem a mesma língua” e, assim como com qualquer cão, ter disposição para abrir mão de broncas e de uma educação baseada em ameaças, medo e força.

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